Swift

A Feira livre – prof. Aldísio Azevedo

 
 Entre Barracas e Memórias: uma análise da feira 

pública de Jaguaruana nos anos de 1920 a 2000


Entrevistamos o professor Aldísio Azevedo Soares*, que em 2005, na sua graduação em História pela UECE, escreveu a monografia com o tema “Entre Barracas e Memórias: uma análise da feira pública de Jaguaruana nos anos de 1920 a 2000”.

O que o levou a pesquisar esse assunto?

Minha esposa frequentava a feira e comecei a frequentar também e o que me encantou foi a ideia de como um espaço público, a rua, tomou uma outra forma. A rua que faz as pessoas transitarem funcionava apenas de meio dia até as seis da noite. No intervalo da madrugada e da noite aquela rua onde se transitava se transformava os pedestres estavam lá a negociar e os comerciantes a vender. Me chamou atenção a mudança de comportamento dos espaços e como as pessoas se apropriavam desses espaços durante as horas do dia.

Comecei a pesquisar como eram as feiras antes de 1920 até 2000, porque é neste intervalo de tempo que se há a construção do mercado público e a passagem da feira dos dias de domingos para os sábados como é atualmente, pois anteriormente os comerciantes aproveitavam os moradores do interior que vinham assistir à missa para estabelecer as suas vendas, mas houve a passagem para o sábado por questão religiosa devido o pároco da época não ter aceitado que houvesse o comércio no mesmo dia da missa então foi feita à transferência mais ou menos entre 1917 a 1920 , não há uma data fixa devido aos entrevistados não terem dado uma data específica.

Que importância você dá a esse fenômeno?

Para mim, como professor de História, é interessante porque é a História ganhando forma. Normalmente temos o hábito de estudar sobre a Revolução Francesa e entender que aquilo é um fato que aconteceu num espaço de tempo e que aquilo ali morreu. Quando na verdade História é poder fazer os nexos entre o passado e o presente. É estudar a ideia de que na Idade Média surge um ato de comércio e que esse ato ganha forma, ganha vida e chega a Jaguaruana e que as pessoas até hoje estabelecem um tipo de comércio, um tipo de local, um tipo de negociação.

Como as pessoas veem a feira livre?

Na minha pesquisa me baseei em Antônio Paulo Resende, que escreveu o livro Recife, o espelho do passado e os labirintos do presente e em uma das aberturas dos capítulos diz “...a rua significa mais do que um lugar de passagem. Ela está lá para ser vivenciada, observada e amada”. Cada pessoa dá a vida à rua pela sua ótica. As pessoas que vão à rua para comprar, as pessoas que vão para namorar, ver, serem vistas, então me chamou atenção a ideia de que um espaço público ganha vida.

Depoimento de um feirante: “Tem um rapaz que aos sábados ele vende tecido, bem mais barato que os outros vendedores da cidade, mas ele só vem aos sábados, e para você conseguir as melhores peças, você tem que acordar bem cedo e chegar lá antes da barraca abrir, quando elas ainda estão sendo montadas. O problema é que muita gente tem essa mesma ideia, então quando o carro chega é aquele monte de mulher lutando por aqueles pedaços de panos, num empurra empurra desgraçado...”. Significa que na feira também é um espaço de disputa, é aquele que leva vantagem, é aquele que perde. A feira não é só o local onde o produto é exposto e alguém compra. A feira também é um local onde as pessoas se encontram nela.

O feirante não se vê como feirante, ele se vê como uma pessoa que vem levar vantagem sobre alguém. O comprador não é um mero comprador, ele entende que o feirante tem esse comportamento, então tem que criar um outro comportamento para levar vantagem sobre o feirante. Cheguei a presenciar mulheres casadas, senhoras mães de família que tem o comportamento exemplar, frequentam a Igreja, participam de Grupo de Casais e que na época da feira colocavam uma blusa tomara que caia, mostravam o decote pra poder insinuar-se ao feirante pra conseguir desconto. Isso é uma curiosidade de como a feira incorpora espaços e as pessoas se adequam a esses espaços.

Cheguei a presenciar mães que levavam os meninos no colo pra poder de alguma forma ganhar espaço na fila ou então ser atendido primeiro pro poder comprar uma peça perante os outros. Eu cheguei a presenciar atos de briga, as pessoas queriam uma peça de tecido, três ou quatro se agarravam e acabavam brigando por essa única peça de tecido.

Quem é da cidade sabe que em determinada época do ano, na festa da padroeira ou no final do ano, nós temos um rua inteira tomada por barracas. Pessoas que aproveitam ainda o momento religioso ou o momento da cidade em que há uma aglomeração maior de pessoas.

Desde a década de 1940, o mercado já passou por três transformações ao longo desses anos. Interessante que quando ele era reformado ou demolido, as pessoas que comercializavam acabavam ainda dos seus espaços no mercado e indo pro meio da rua, foi isso que deu origem a essa feira de rua que nós temos atualmente. Tanto que foi construído um novo mercado para as pessoas das frutas e do peixe, mas eles continuam indo para o meio da rua, porque eles acreditam que a rua é um local de mais venda do que um local fechado.

O segundo mercado, na década de 1980, tinha dois espaços a parte interna era o local de vendas de carnes e verduras. A parte de fora era onde acontecia a venda de outros objetos, como roupas, brinquedos e o construtor da época teve a ideia de construir bancos para as pessoas sentarem e à noite, como a praça não era iluminada, mas o mercado era, servia como ponto de namoro o antigo mercado. Era um local das pessoas se encontrar, se ver.

Após a sua pesquisa, quais reflexões você faz acerca disso tudo?

Uma delas é que todo espaço é vivo. Temos a mania de passar pelos espaços e nos acostumar com ele, mas na verdade todo espaço é vivo, tem sua dinâmica e tem suas regras próprias, que fogem até da regra legal, da regra constitucional. Cada espaço é uma construção pessoal dos usuários.



*Aldísio Azevedo Soares é graduado em História (UECE), especialista em História e Cultura Africana (FIJ) e Coordenação Escolar (UFC)

























Você pode gostar também

0 comentários